Moda Sustentável e o Empoderamento Local: O Trabalho das Artesãs da Rocinha
- Comunicação Favela In
- 26 de fev.
- 5 min de leitura
A moda sustentável tem ganhado força nos últimos anos, e na favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, ela se tornou um verdadeiro instrumento de transformação social. Através do Projeto Relíquia, um grupo de artesãs vem revolucionando o mercado ao transformar resíduos têxteis e outros materiais reaproveitados em peças únicas de vestuário e acessórios. Mais do que uma prática sustentável, essa iniciativa promove a economia circular, empodera as mulheres da comunidade e gera renda, proporcionando uma forma de resistência cultural e ambiental.
Apesar do impacto positivo, essas artesãs ainda enfrentam desafios como a invisibilidade e o apagamento de suas histórias. Muitas vezes sem o reconhecimento que merecem, elas seguem costurando e criando verdadeiras obras de arte, provando que a moda pode ser, além de estilo, um símbolo de luta e resiliência.
O que essas mulheres fazem é muito mais do que simplesmente criar roupas. Elas estão empoderando-se ao desenvolver um trabalho que reflete suas culturas, suas histórias e a resistência da favela. Essas peças não são apenas um reflexo da identidade de quem as cria, mas também uma forma de gerar renda e autonomia. Além disso, elas contribuem para a preservação do meio ambiente ao utilizar resíduos têxteis, um material descartado que, se não reaproveitado, acabaria contribuindo para o crescimento da montanha de lixo que desafia o planeta.
O Apagamento das Artesãs e a Necessidade de Reconhecimento
Embora estas artesãs desempenhem um papel essencial nesse movimento de moda sustentável, elas frequentemente enfrentam o apagamento de suas histórias e contribuições. O trabalho delas, muitas vezes invisibilizado, não recebe o reconhecimento merecido, e sua importância para a moda sustentável e para a economia local é frequentemente desconsiderada.
Em uma entrevista escrita por Daniel Martins e postada no mês de Dezembro de 2018, através do portal da Agência Câmara de Notícias. Maria Cleide, integrante da Central Veredas, destacou a organização da cooperativa por meio de uma rede solidária, onde toda a matéria-prima é compartilhada, desde a fibra até os corantes naturais. No entanto, ela lamentou a falta de reconhecimento nacional do trabalho artesanal: “Estou desde 2004 nessa jornada e não é fácil. Temos pessoas capacitadas, somos conhecidos internacionalmente por conta do nosso trabalho, mas nacionalmente não conseguimos o mesmo reconhecimento”, afirmou.
É fundamental que a sociedade comece a valorizar estes artesãos e o trabalho incrível que eles realizam, reconhecendo-os como protagonistas desse movimento de mudança social e ambiental. Sem esse reconhecimento, o ciclo de desigualdade e apagamento continua a marginalizar iniciativas tão poderosas e necessárias, como a entidade Central Veredas, o Projeto Relíquia e tantos outros.
Rita Cavalcante, uma das artesãs envolvidas no Projeto Relíquia, destaca a satisfação de ser reconhecida na I Mostra Favela In e o orgulho de ver suas criações expostas no evento: “Fico muito feliz e muito satisfeita, porque é um trabalho que eu faço com muita dedicação, amor e carinho. Dá para notar que eu trabalhei a cada minuto nessas peças que eram muito difíceis, e através do reaproveitamento eu consegui transformar em peças lindas. Trabalho há muito tempo com costura e para mim foi uma honra trabalhar com o Projeto Relíquia. Fiquei muito feliz mesmo.”
Esse esforço evidencia não apenas a importância do trabalho das costureiras como expressão cultural, mas também sua relevância na promoção da sustentabilidade e na geração de oportunidades para artesãs de comunidades periféricas.
Produção Sustentável: 100% da Matéria-Prima Vem de Recortes Reaproveitados da Indústria Têxtil
A moda sustentável, especialmente no contexto da Rocinha, vai muito além do simples uso de materiais reciclados. 100% da matéria prima utilizada para produção é oriunda de recortes reaproveitados da indústria têxtil. Cada peça de vestuário e cada acessório tem uma história e são únicas, em um mercado saturado de roupas em massa e descartáveis. Ao reaproveitar o que seria descartado no meio ambiente, elas não apenas diminuem a quantidade de resíduos poluentes, mas também demonstram a importância de uma economia circular, onde os materiais transitam de volta para o mercado, em vez de serem descartados.
Jaqueline Nascimento, outra participante do projeto Relíquia, celebrou a oportunidade de dar visibilidade ao projeto através do evento de I Mostra Favela In:
“Nós, moradores de comunidade, não temos o mesmo acesso que muita gente tem à grande moda. Mas, através deste projeto, conseguimos mostrar para aqueles que também não têm muito acesso uma moda que é, além de tudo, sustentável. Conseguimos provar que aquilo que seria descartado pode virar uma moda que é para todos.”
Esse movimento é uma das formas mais eficazes de combater os efeitos negativos da indústria da moda tradicional, que é uma das mais poluentes do mundo. De acordo com estudos, a ineficiência da indústria têxtil é responsável pel desperdício e a reutilização de materiais reduz significativamente os impactos ambientais.
Economia Circular: Uma Alternativa Sustentável e Rentável
A economia circular propõe justamente o contrário do sistema linear tradicional (produzir, usar e descartar): ela visa a recuperação e o reaproveitamento de recursos, minimizando o desperdício e o impacto ambiental. Ao adotar essa prática, as artesãs da Rocinha não apenas preservam o meio ambiente, mas também criam uma fonte de renda sustentável para suas famílias.
Esse modelo circular também reforça a importância da valorização das peças únicas. Cada roupa produzida de forma artesanal carrega a identidade da comunidade onde ela foi criada. Não se trata apenas de uma transação comercial, mas de uma troca cultural e social que valoriza o trabalho local e promove a autossuficiência dentro da favela.
O Meio Ambiente e os Benefícios do Descarte Consciente
Ao falar sobre a moda sustentável, é impossível ignorar o impacto devastador que o descarte inadequado de roupas tem no meio ambiente, resultando em lixões e aterros sanitários que não absorvem essa quantidade de resíduos, além de contribuir para a poluição dos rios e oceanos.
A indústria da moda enfrenta desafios ambientais não apenas pelo volume de peças descartadas, mas também pelos materiais utilizados na produção das roupas, que, em grande parte, derivam do petróleo. De acordo com uma matéria publicada pelo site da CNN, segundo o relatório Fashion on Climate, desenvolvido pela Global Fashion Agenda em parceria com a consultoria McKinsey & Company, “as empresas do mundo da moda emitiram, em 2018, cerca de 2,1 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa em todo o mundo.” Esse dado reforça a urgência de repensar práticas e buscar alternativas mais sustentáveis para o setor.
O reaproveitamento de resíduos da indústria têxtil não só ajuda a reduzir esse impacto, mas também traz um benefício econômico local, uma vez que esses resíduos são reutilizados para criar novos produtos de valor. Com a ajuda do Projeto Relíquia, as artesãs da Rocinha conseguiram transformar cerca de 80 quilos de resíduos têxteis em 120 peças únicas na sua edição piloto. Estes produtos foram apresentados ao público em três eventos ao longo do ano de 2024.
Ao apoiar iniciativas como as das artesãs da Rocinha, estamos ajudando a diminuir essa pegada ecológica e a promover uma forma mais responsável de consumo. A conscientização sobre o descarte consciente e a adoção de práticas sustentáveis são fundamentais para reverter o ciclo vicioso de desperdício que caracteriza a moda convencional.
O Papel das Empresas no Descarte Sustentável de Resíduos Têxteis
A indústria da moda é uma das mais poluentes do mundo, e o descarte inadequado de resíduos têxteis é um dos seus maiores desafios ambientais. A cada ano, milhões de toneladas de tecidos são descartadas, sobrecarregando aterros sanitários e contribuindo para a poluição do solo e da água.
Diante desse cenário preocupante, empresas inovadoras têm se destacado ao desenvolver soluções sustentáveis para minimizar os impactos desse desperdício. Apostando na reutilização desses materiais, essas iniciativas promovem a economia circular, transformando resíduos em novos produtos e reduzindo significativamente o impacto ambiental do setor têxtil.
A transição para uma economia circular no setor têxtil requer esforços conjuntos de empresas, consumidores e governos. Ao adotar práticas sustentáveis e investir em soluções inovadoras, é possível minimizar o impacto ambiental da indústria da moda e promover um futuro mais responsável e ecológico.
REFERÊNCIAS
Câmara dos Deputados: https://www.camara.leg.br/noticias/549326-ENTIDADES-RELATAM-DIFICULDADES-ENFRENTADAS-PELOS-ARTESAOS-NO-BRASIL?
Descarte indevido dos resíduos têxteis: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/brasil-descarta-mais-de-4-milhoes-de-toneladas-de-residuos-texteis-por-ano/
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